Olá, finalmente trouxe o conto :D Espero que gostem.
Já agora um aviso, nós criamos uma página no face sobre leitura. Passem por lá, por favor. Link: https://www.facebook.com/leiturassecretas?ref=hl
Aqui vai uma música para acompanhar o início da leitura:
-Tenho medo
papá. – Chorei encolhendo-me no colo do meu pai.
-Porquê
minha pequenina? – Sorriu calorosamente.
-Tenho medo
que a mamã nunca mais volte do médico.
-A mamã vai
ficar bem princesinha. – Assegurou o meu pai com uma lágrima no canto do olho.
Estava de
volta a este hospital horrendo, a esta mesma sala de espera enquanto recordava
a lembrança de quando a minha mãe soube que tinha cancro e que só tinha quatro
meses de vida. Esta sala parecia estar mais alegre do que á vinte anos atrás.
Também era de esperar. Estamos quase na época natalícia, só faltam dois meses
para o Natal, mas mesmo com estas decorações e a faixa pendura em cima do
balcão de informações a desejar um feliz ano de 2450, a sala cheirava a doença,
a tratamentos, a vidas desperdiçadas, a novas vidas, a vidas prolongadas, a
pessoas recuperadas, a pessoas em sofrimento e a esperança, apesar de não ser
nada fácil estar ali.
Tal como eu,
várias pessoas estão dependentes de tratamento contra uma doença qualquer. No
meu caso é cancro nos pulmões, tal como a minha mãe. Tenho vinte e seis anos,
sou uma mulher feita. Tenho um trabalho, uma casa e um pai. Nada de irmãos,
irmãs, primos, tios e por aí em diante. Só sou eu e o meu pai, mais ninguém.
Sou o que se pode chamar de bem-sucedida no seu próprio trabalho.
Observei um pequeno robô de um metro. Parecia
uma pessoa, melhor, um anão. Continuei a observá-lo. O robô mudou o programa
que estava a dar numa televisão incorporada na parede. Deu meia volta e
desapareceu na esquina.
-Valéria
Nunes. – Chamou uma voz masculina pelo altifalante transparente colocado na
parede. – Consultório quatro.
-Pai. Fica
aqui. Eu vou sozinha. – Sorri e dei-lhe um beijo na testa.
-Tudo bem
pequenina. – Tantos anos que se passaram e o meu pai ainda não me deixara de chamar pequenina.
Peguei na
minha mala e dirigi-me para o consultório. Bati à porta e ouvi a mesma voz
masculina. – Entre.
Entrei e vi
que não era o médico que seguia o meu caso. – O Dr. Silva não está?
-Está
doente. Eu vou substituí-lo. Sente-se. – Ordenou apontando para as duas
cadeiras que tinha à frente dele. – Estive a ler o relatório do Dr. Silva sobre
si vezes sem conta. Devo dizer que fiquei intrigado por não querer ser operada.
– Calou-se como se estivesse à espera de uma explicação.
-Sim. –
Olhei para a placa onde tinha o nome dele preso à bata. Chamava-se Nuno
Rodrigues. – Não quero fazer a operação.
-Porquê? –
Perguntou passado alguns segundos.
-Se fizer a
operação tenho sessenta por cento de possibilidade de morrer. – Olhei para os
meus pés. – É uma probabilidade muito grande. Não posso morrer rapidamente.
Tenho de cuidar do meu pai…
-Mas também
se não a fizer morrerá de certeza! – Falou duramente.
-Talvez
consiga melhorar com os novos tratamentos… - Tentei sorrir.
-Talvez...
Mas não é certo. – Não moveu nenhum músculo da cara. – Esta operação é
delicada. É das novas cirurgias, ainda não foi muito experimentada. Aposto que
se a fizer conseguirá sair do bloco operatório com o pulmão completamente
regenerado.
-Mesmo assim
é uma probabilidade muito alta… Não posso decidir assim, tenho de pesar as
coisas. – Olhei-o nos olhos azuis.
-A senhora é
que sabe. Ninguém a pode obrigar. – Começou a mexer nuns papéis. – A sua nova
consulta está marcada para de hoje a quinze dias. Enquanto isso continue a
fazer o tratamento com os medicamentos em casa e tem de vir ao hospital dia
sim, dia não para fazer um tratamento ainda mais extensivo. – Começou a escrever
num papel. – Aconselho-a a não fazer grandes esforços, a por baixa no trabalho
e a descansar muito. – Olhou para mim de novo com um ar de preocupado. – Se
tiver muitas dores tome isto. – Passou a receita para a minha mão.
-Obrigado. –
Meti dentro da minha mala. – Bom fim-de-semana. – Levantei-me e sai do
consultório.
Dirigi-me
para a beira do meu pai. Ele estava a falar com uma senhora já idosa e estava a
ajudá-la a levantar-se. Quando me viu sorriu e apontou para mim, para a senhora
ver quem era. Aposto que estava a dizer coisas como por exemplo: é aquela a
minha menina, tem os olhos da mãe, é linda como a mãe. São coisas que o meu pai
dizia sempre às pessoas.
-Paizinho.
Vamos embora? – Sorri debilmente.
-Sim minha
filha. Vamos lá. - O meu pai despediu-se da senhora, pegou no seu casaco e
agarrou-se ao meu braço. – Como foi a consulta? O que o Dr. Silva disse?
-Não foi o
Dr. Silva, foi outro médico. E ele disse que eu estava a recuperar bem. – Menti
ligeiramente e para reforçar a minha mentira, sorri. – Por acaso disse que sou
capaz de viver mais uns anos se for bem cuidada.
-Já não
precisas de fazer a operação? – Olhou-me desconfiado.
-Não.
-Porque me
mentes tão descaradamente Valéria? Eu conheço-te. – Entregou os cartões do
hospital no balcão. – O que realmente o médico disse?
-Pai… Deixa
lá, eu vou melhorar! – Sorri e pus o meu braço à volta dos ombros dele. – O que
interessa é que ainda vais aturar-me durante mais algum tempo!
-Val, por
favor, não digas como se fosse pouco tempo. – Parou-me e agarrou-me os ombros.
– Promete-me que vais fazer a operação!
-Pai, não é
assim tão fácil…
-Porra,
promete-me! – Berrou comigo já meio alterado. – Promete!
-Está bem,
eu faço a operação quando não houver mais nada. Quando as coisas estiverem a
ficar realmente pretas eu faço a operação. – Comecei a chorar. O meu pai
abraçou-me fortemente e acariciou-me a cabeça.
-Pronto
pequenina, já passou. Vamos embora daqui.
Caminhamos
por mais um bocado até chegarmos ao carro. O meu pai passou-me as chaves e
deixou-me guiar até casa. Nossa, adorava carros e motos. Deslizavam tão bem na
sua maneira flutuante pelas compridas estradas.
********************
Eram 6h30 da manhã de um domingo. Não tinha
conseguido dormir nada. Revirei-me durante toda a noite de um lado para o
outro. Não sabia o que fazer. Desci até á cozinha para ir beber um copo de
leite frio. Tentei passar o maior tempo possível a fazer alguma coisa, a lavar
a cozinha, a casa de banho, a regar as plantas e mesmo assim ainda não tinha
passado muito tempo. Eram só 8h da manhã.
Estava farta
de estar em casa, portanto vesti uma roupa confortável, peguei nuns livros
infantis da estante e guiei até o hospital. Dei entrada no balcão e segui para
a ala das crianças doentes. Fui buscar algumas crianças ao quarto e
aconcheguei-as na sala de divertimento. Puxei uma cadeira e comecei a ler-lhes
algumas histórias. Á medida em que fui lendo, muitas mais crianças e
enfermeiras juntaram-se a minha volta só para escutarem por um bom momento a
história. – E, assim, a Bela e o Monstro viveram felizes para sempre. – Sorri
para todos. As crianças começaram a pedir outra história e a seguir mais outra,
até que fiquei sem nenhum livro para ler. Depois de prometer que voltava lá com
mais histórias reparei que estava quase na hora do almoço.
Olhei em
volta e as crianças já estavam a voltar para os seus quartos, menos uma. – Olá
pequenina, como te chamas?
-Cristina. –
Olhou muito timidamente para o chão. – Muito obrigado por ter vindo cá
visitar-nos. – Deu-me um abraço rápido e correu de volta para o seu quarto.
-Ela é muito
tímida. – Falou uma voz masculina um pouco familiar. – Quase nunca fala com
ninguém. – Olhei para trás. – O que faz aqui senhora Valéria? Pelo que me
pareceu tem um pouco de nojo por hospitais.
-Estava às
voltas em casa, pareceu-me bem vir para aqui visitar algumas crianças Dr.
Rodrigues.
-Tenho a
certeza que elas todas ficaram muito contentes. – Sorriu.
-Sim,
talvez… - Tentei sorrir. – O que faz aqui?
-Também vim
visitar algumas crianças. Principalmente a Cristina,- riu um pouco perante a
minha cara de confusa – é a minha única sobrinha.
-Ah, que ela
tem? – Inclinei a cabeça
-Se me
acompanhar no almoço, eu conto-lhe.
-Tudo bem. –
Respondi intrigada pelo problema daquela criança.
Caminhamos
em silêncio lado a lado, primeiro até fora do hospital e depois até um pequeno
restaurante a um quarteirão de distância dele. O restaurante, como já disse, é
pequeno, mas muito confortável. As suas paredes são de cor bege e castanhas. Tem
mesas e cadeiras de madeira espalhadas pela sala. Sentamo-nos numa mesa perto
do balcão.
-Então, -
tossi um pouco para chamar a atenção dele – qual é o problema de Cristina?
-O que vai
escolher? – Sorriu e voltou a olhar para a ementa.
-Só uma
sopa, mais nada.
-Só isso?
Deveria comer mais, com os seus tratamentos… Deveria de se alimentar melhor! –
Olhou preocupado.
-Não tenho
fome, não se preocupe. – Sorri a emprega que se aproximou e pedi um prato de
sopa e um copo de água enquanto o Dr. Rodrigues pedia o que queria.
-Então, já
me pode contar?
-A Cristina
tem cancro no estômago. – Olhou sem nenhuma emoção visível. – Ela não tem
muitas forças, por acaso, hoje foi um dos dias melhores dela… Ela não tem muita
esperança de recuperação. – Bebeu um pouco da sua água. – O que fez hoje pelas
crianças foi fantástico… Eles adoraram!
-Vou ver se
consigo vir visitá-los mais vezes. – Sorri. – Gostei bastante deles!
-E eles de
si. – Sorriu também.
Ficamos em
silêncio até ao fim da refeição. Voltamos para o hospital e decidi ir, outra
vez, até a ala de pediatria.
-Qual é o
quarto da Cristina? – Perguntei sem olhá-lo nos olhos.
-Eu levo-a
lá. – Acenou com a cabeça para eu o seguir.
Cristina
estava deitada de lado na cama, não estava a dormir, mas estava calma como se
estivesse a dormir.
-Cristina? –
O tio chamou por ela. – Tens uma visita, querida.
Cristina
levantou-se a custo da cama e ficou surpreendida quando me viu. Ela sorriu e
chegou-se um pouco para a borda da sua cama flutuante e eu, como resposta,
sentei-me na borda adjacente da sua cama.
-Olá. –
Sorri. – Trouxe-te uma coisa…
Procurei na
minha mala o medalhão e olhei para ele antes de o entregar. Ia-me custar
dar-lho, pois foi o medalhão que a minha mãe me tinha dado para me proteger,
mas, neste momento, Cristina precisava mais do que eu. Era um pequeno medalhão
em prata com a imagem de Jesus Cristo.
-Este
medalhão foi a minha mãe que mo deu antes de falecer… - Sorri perante as
lágrimas daquela inocente e esbelta miúda. – Ela disse-me algo parecido com o
seguinte: este medalhão vai ajudar-te, vai dar-te esperança! Acredita nele e
conseguirás alcançar o que mais desejas.
-Não posso
aceitar, foi a sua mãe que lho deu… - A menina choramingou.
-Aceita. Por
mim já nada mais tem a fazer. – Puxei a mão dela e abri-lhe aqueles pequeninos
cinco dedos e depositei lá a pequena peça. – Trata-me por tu. Chamo-me Valéria.
-Obrigado Valéria.
– Cristina abraçou-me fortemente e por uns minutos ficamos assim abraçadas.
-Tenho de me
ir embora. – Afastei-me um pouco. – Tenho o meu pai à minha espera em casa. –
Dei-lhe um beijo de despedida no rosto.
Levantei-me
e vi que o Dr. Rodrigues estava a sorrir, sorri de volta. Peguei na minha mala
e quando ia a sair pela porta, a voz trémula da menina chamou-me.
-Sim? – Virei-me para ela.
-Vais voltar
a visitar-me?
-Claro que
vou! – Sorri alegre pela pergunta da menina. – Óbvio que vou! Fiquei encantada
por ti! – Pisquei-lhe o olho. Cristina sorriu e voltou a deitar-se mais para
baixo em posição fetal.
Já estava a
chegar ao meu carro quando senti alguém puxar-me o braço. O Dr. Rodrigues
estava a agarrar-me.
-Mais uma
vez, obrigado. – Sorriu. – Significou muito para ela.
-De nada Dr.
Rodrigues.
-Trata-me
por Nuno. – Nuno ainda não tinha largado o meu braço. – Posso tratá-la por
Valéria?
-Sim. Podes.
– Sorri de volta.
-Quando é que te volto a ver? – Nuno
perguntou.
-Na próxima
consulta…
-Não vai
haver próxima consulta. – Largou-me e olhou para o chão. – Sou só um substituto
para os pacientes do Dr. Silva, mais nada.
-Então acho
que não nos voltaremos a ver. – Suspirei ruidosamente.
-Mas eu
quero voltar a ver-te Valéria. – Ficou pensativo e eu tentei não olhar para
ele. – Que tal no próximo sábado irmos jantar?
Olhei para
ele e ele estava a sorrir esperançoso. – Sim…
-Então eu
depois entro em contacto contigo para combinarmos melhor como vai ser.
-Tudo bem. –
Entrei dentro do carro depois de me ter despedido dele.
********************
Faltam só
três semanas para o Natal e cada vez mais estou a sentir-me mais fraca. Cada
dia que passa começa a ficar insuportável levantar da cama. As dores
alastraram-se por todo o meu corpo, tanto internamente como externamente. Às
vezes, acordo de manhã e não consigo distinguir o escuro do claro. Tem sido
semanas insuportáveis. No meio disto tudo, só uma única pessoa conseguia
tirar-me de casa. Um homem com os seus trinta anos, de olhos azuis e loiro. Era
Nuno. Ele é simplesmente fantástico e atencioso comigo. Ele zela pela minha
vida. Faz mais do que devia. Não posso negar que não tenho sentimentos por ele,
porque eu tenho! Ele tem insistido comigo para eu fazer a operação, mas eu não
tenho a certeza.
Comecei a
ter uma dor aguda por todo o corpo e caí ajoelhada no chão da sala. Só ouvi o
meu pai a chamar por mim e depois, perdi os sentidos completamente.
********************
Abri os
olhos e deparei-me com um teto branco. Olhei para o lado e o meu pai estava
sentado na cadeira ao lado da cama e estava a falar com o Nuno.
-Que se
passou? – Perguntei confusa e fracamente.
-Tiveste um
ataque e foste operada. – Foi o Nuno que falou. – E saíste com um pulmão
regenerado. – Sorriu. – Funcionou! Não tens mais cancro!
-Que dia é
hoje? – Tentei assimilar a informação toda dentro do meu cérebro.
-Dia 24 de
Dezembro. Estiveste em como quase três semanas. Foi a pior parte.
-Ah… Bom… -
Olhei confusa para eles. - Daqui a quanto tempo é que tenho alta?
-Esse é
outro ponto mau, só daqui a algumas semanas é que podes sair.
-Tanto
tempo! – Olhei outra vez para o teto.
-O que
interessa é que estás viva, minha filha. – O meu pai sorriu.
********************
Era uma da
manhã do dia de 25 de Dezembro, dia de Natal. O meu pai já tinha ido embora à
meia hora atrás e ainda não tinha conseguido adormecer. Tinha sido um dia
exaustivo. Por menos estava recuperada.
-Valéria? –
Nuno chamou-me na porta de entrada.
-Sim?
-Vamos dar
uma volta, é dia de Natal. – Sorriu e tinha na mão umas quantas mantas. – Vais
ter de estar quentinha para irmos lá fora. – Aproximou-se da minha bomba de
oxigénio e pô-la em modo de flutuar. Pegou em mim e pôs-me numa cadeira de
rodas e levou-me até a uma ponte por cima de um rio.
A noite
estava linda apesar do frio de rachar. A lua estava lá no alto com aquele
prateado brilhante. Era uma simples paisagem magnífica.
Nuno
sentou-se na beira da ponte e ficou a observar-me durante uns longos minutos.
-Vais falar
comigo? – Sorri. – Ou só vais ficar ai a olhar-me?
-Vou-te dar
uma prenda… - Sorriu de volta. – Espero eu!
-Uma prenda?
– Perguntei desconfiada.
Nuno
ajoelhou-se diante de mim e pegou na minha mão. Reparei nuns quantos fios de
cabelos brancos e sorri. Tantas vezes lhe tinha dito que estava velho.
-Não tens a
noção de como foram as últimas semanas… - Brincou com a minha pequena mão. –
Tinha medo que nunca mais acordasses. – Suspirou. – Adoro tudo em ti, Valéria.
Quero ficar contigo para sempre! – Com a mão livre, Nuno tirou uma pequena
caixa de dentro do casaco e abriu-o. – Casa-te comigo.
Olhei para a
caixa que continha um bonito anel de noivado e comecei a chorar. – Sim, caso. –
Sorri radiante. Nuno agarrou-se a mim num abraço de urso e deu-me um longo e
profundo beijo.
Então? Gostaram? :D
-F